Com o advento da reforma trabalhista trazida por meio da Lei 13.467, de 13 de julho de 2017, a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) foi alterada no que tange ao tema grupo econômico, objetivando enrijecer as possibilidades para o reconhecimento de grupo econômico, na medida em que trouxe novos parâmetros para responsabilização de empresas terceiras.
Vamos analisar a situação antes e após a reforma trabalhista.
- Antes da Reforma Trabalhista
Antes da reforma trabalhista o reconhecimento de grupo econômico ocorria com a simples demonstração da identidade dos sócios e da relação de coordenação entre as empresas. Não havia exigência de comprovação de que as empresas tivessem ingerência umas sobre as outras ou apenas de uma nas demais.
Desta forma, anteriormente à Lei 13.467/17, verificava-se decisões judiciais incluindo empresas terceiras, estranhas ao processo, ou seja, que nunca tiveram qualquer relação com a causa, já na fase de execução das ações judiciais, sendo citadas para pagamento do débito de determinado processo.
A legislação anterior previa que, embora cada uma das empresas tivesse personalidade jurídica própria, se fosse detectado que estava sob a direção, controle ou administração de outra, ambas seriam solidariamente responsáveis.
Desta forma, a simples identidade de sócios na empresa executada e na empresa terceira já fundamentava a inclusão desta última no processo, e determinação da responsabilidade solidária das duas em relação ao crédito trabalhista.
Todavia, com a reforma trabalhista este cenário modificou, ao menos na literalidade da lei.
- Após a Reforma Trabalhista
A Lei 13.467/20 alterou a redação do § 2º, e inseriu o § 3º no artigo 2º da CLT, prevendo, expressamente, que não basta apenas a mera identificação dos sócios e uma relação de coordenação.
Confira-se a redação do artigo 2º da CLT e seus parágrafos 2º e 3º:
Art. 2º – Considera-se empregador a empresa, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviço.
§ 2° Sempre que uma ou mais empresas, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, ou ainda quando, mesmo guardando cada uma sua autonomia, integrem grupo econômico, serão responsáveis solidariamente pelas obrigações decorrentes da relação de emprego.
§ 3° Não caracteriza grupo econômico a mera identidade de sócios, sendo necessárias, para a configuração do grupo, a demonstração do interesse integrado, a efetiva comunhão de interesses e a atuação conjunta das empresas dele integrantes. (Grifo nosso)
Além de a lei dizer que não basta a mera identidade de sócios para configurar grupo econômico, dispôs também os requisitos caracterizadores do referido grupo, quais sejam: “a demonstração do interesse integrado, a efetiva comunhão de interesses e a atuação conjunta das empresas dele integrantes”.
A intenção do legislador foi de evitar decisões judiciais que determinavam a existência de grupo econômico de uma forma extremamente ampla, com base apenas em princípios e teorias que, de certa forma, conflitavam com outros princípios, como o da segurança jurídica, por exemplo.
A alteração legislativa trouxe maior segurança jurídica para as empresas, na medida em que elas somente serão responsáveis solidariamente pelos débitos trabalhistas em casos de existência de grupo econômico nos moldes fixados e acima indicados.
Diante da demonstração do que prevê a Lei, de forma teórica, antes e depois da reforma trabalhista, vamos analisar como o tema tem sido entendido na prática na jurisprudência, pelas turmas do Tribunal Regional da Terceira Região e pelo Tribunal Superior do Trabalho.
- Do entendimento do Tribunal Regional da 3ª Região – TRT3
O TRT3 é o tribunal do trabalho responsável pelas ações ajuizadas no estado de Minas Gerais. No âmbito do TRT3 há várias Turmas, sendo que cada uma é composta por 3 desembargadores que vão analisar os recursos judiciais.
Pode ocorrer de turmas terem entendimentos distintos acerca de um mesmo tema, por isto a relevância de pontuar o entendimento de várias turmas sobre a configuração de grupo econômico após a reforma trabalhista.
Vejamos o que vem decidindo a 1ª Turma do TRT3:
EMENTA: GRUPO ECONÔMICO. A figura juslaborista do grupo econômico não se submete à tipificação legal de grupo econômico que impera em outros ramos do direito, tampouco se sujeita aos requisitos de constituição que podem emergir como relevantes nesses segmentos estranhos ao Direito do Trabalho. Para efeitos trabalhistas, a caracterização do grupo econômico diz respeito à existência de nexo relacional entre as empresas, ou seja, de uma relação de coordenação ou elo interempresarial, concentrando-se a atividade empresarial num mesmo empreendimento, independentemente da diversidade das pessoas jurídicas.
A posição da 1ª Turma é de que a configuração do grupo econômico não pode ser analisada na esfera trabalhista da mesma forma que é vista nos outros ramos do direito. Em outras palavras, no Direito do Trabalho impõe-se interpretação mais flexível no que diz respeito ao reconhecimento do grupo econômico, eis que o escopo legal é a tutela do empregado, assegurando-se a este a possibilidade de ampliar a garantia do crédito trabalhista.
A referida Turma não ignora os requisitos do interesse integrado, da efetiva comunhão de interesses e da atuação conjunta das empresas dele integrantes, apenas entende que na esfera do direito do trabalho, por se tratar de verba alimentar, a análise deve ser mais ampliativa.
Verifica-se a seguir o entendimento da 3ª Turma do TRT3:
GRUPO ECONÔMICO – CONFIGURAÇÃO. No âmbito trabalhista, o conceito de grupo econômico se presta a ampliar as garantias de satisfação do crédito de natureza alimentar. Não há necessidade de prova da existência de uma relação de dominação entre as integrantes do grupo, com uma das empresas exercendo direção ou controle sobre a outra.
A 3ª Turma tem um posicionamento similar ao da 1ª Turma. O entendimento é de que não há necessidade de dominação, controle entre as empresas, e, como na Turma anterior, o conceito de grupo econômico deve ampliar as garantias do empregado.
Na verdade, a 3ª Turma não vai contra o dispositivo legal trazido pela reforma, pois este não traz como requisito a dominação ou controle entre as empresas, mas sim interesses em comum e atuação conjunta.
Na visão da 3ª Turma, para configuração do grupo econômico, no âmbito trabalhista, não é necessário que uma empresa seja a administradora da outra ou esteja caracterizado um grau hierárquico ascendente, bastando uma relação de simples coordenação dos entes empresariais envolvidos, conceito obtido por uma evolução na interpretação do § 2º do artigo 2º da CLT.
Vamos agora ao entendimento da 5ª Turma do TRT3:
EMENTA: GRUPO ECONÔMICO. COMUNHÃO DE INTERESSES. Comprovada a efetiva comunhão de interesses, bem como a atuação conjunta das empresas envolvidas, nos termos dispostos no artigo 2º, § 2º da CLT, impõe-se o reconhecimento de grupo econômico, com responsabilização solidária das reclamadas pelo pagamento dos créditos trabalhistas.
A 5ª Turma já baseia sua posição na identificação da comunhão de interesses, que, quando verificada no caso concreto, acarretará reconhecimento de grupo econômico.
A Turma também entende que é admitida a figura do grupo econômico familiar, por coordenação, ou, até mesmo, na hipótese de empresas que trabalham em prol de um objetivo comum, em regime de cooperação recíproca. Se os sócios das reclamadas pertencem a uma mesma família, e ambos os empreendimentos estão localizados muito próximos, é forte indício de grupo econômico.
Vamos ao entendimento da 10ª Turma:
EMENTA. GRUPO ECONÔMICO. CONFIGURAÇÃO.O grupo econômico conceitua-se como o conglomerado de empresas que, embora tenham personalidade jurídica própria, estão sob o controle administrativo ou acionário de outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de outra atividade econômica. Fica caracterizado, ainda, quando existente relação de coordenação, ou seja, a comunhão de interesses para execução de determinado objetivo comum, sendo as empresas solidariamente responsáveis pelos débitos trabalhistas decorrentes da relação de emprego, nos termos do art. 2º, § 2º, da CLT. Nessa perspectiva, é importante ressaltar que, segundo as disposições do art. 2º, §2º, da CLT, não é necessário que as empresas estejam formalmente organizadas em uma estrutura hierárquica para que lhes possa ser atribuída responsabilidade solidária pelo adimplemento de créditos trabalhistas. Na realidade, a jurisprudência deste Regional, em face do princípio protetor do Direito do Trabalho, reconhece a configuração do grupo econômico diante de um liame de coordenação, caracterizado, por exemplo, pela comunhão de interesses econômicos e atuação conjunta das empresas. E, “in casu”, verifico que os elementos de prova convergem no sentido da configuração do grupo econômico.
O núcleo central do posicionamento da 10ª Turma está no controle administrativo ou acionário de uma empresa em outra (s), e na relação de coordenação, comunhão de interesses para execução de determinado objetivo comum.
Assim, de acordo com a Turma, para a formação de um grupo econômico não é mais necessário estabelecer uma relação de domínio (hierárquica e assimétrica) entre as empresas para fazer incidir sobre cada uma delas responsabilidade solidária quanto ao adimplemento de obrigações trabalhistas em geral.
Restou claro para os membros deste colegiado que a lei da reforma trabalhista ampliou as hipóteses de solidariedade entre os tipos de grupo econômico atingindo também os grupos por coordenação, desde que entre as empresas haja interesse integrado, efetiva comunhão de interesses e a atuação conjunta, não bastando a simples identidade total ou parcial de sócios.
Por fim, vamos analisar o entendimento de mais uma turma do TRT3, 11ª Turma, para concluirmos a posição da maioria dos membros deste tribunal.
GRUPO ECONÔMICO. CARACTERIZAÇÃO. A caracterização do grupo econômico para fins justrabalhistas, não se reveste das mesmas formalidades exigidas no Direito Econômico ou no Direito Comercial. São suficientes para se concluir pela sua existência, nesta seara, a mera existência de relação de coordenação entre as empresas partícipes de um mesmo, somada a fatores como comunhão de interesses e integração interempresarial no desempenho das atividades. Registre-se que o art. 2º, §2º, da Consolidação, tem como desiderato ampliar as possibilidades de garantia do crédito trabalhista, responsabilizando todas as empresas componentes do grupo econômico.
O entendimento da 11ª Turma é bem similar ao da 1ª Turma, no sentido de que a análise de grupo econômico na esfera trabalhista deve se dar de forma distinta dos direitos econômico e comercial, de modo a ampliar as possibilidades de garantia do crédito trabalhista.
De acordo com a citada Turma, no Direito do Trabalho, para que se configure grupo econômico, não necessariamente deve existir uma empresa líder administrando e controlando as demais, importando apenas investigar o nexo de coordenação entre elas.
Diante do exposto, pode-se concluir que o entendimento em comum das Turmas do TRT3 é no sentido de que, na aplicação da lei nova, em tudo que reduz os direitos até então conferidos ao trabalhador, o intérprete deverá considerar os princípios da primazia do trabalho, da dignidade do trabalhador e da inalterabilidade das condições contratuais mais benéficas, conforme previsão contida no artigo 468 da CLT, ainda em vigor.
- Do entendimento do Tribunal Superior do Trabalho – TST
A jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho (TST) já pacificou o tema no sentido de que o simples fato da existência de sócios em comum não é capaz de configurar grupo econômico, e que a coordenação entre as empresas, sem relação hierárquica, também não caracteriza o referido grupo, restando afastada a responsabilização solidária.
Este entendimento do TST não tem sido adotado pela maioria das Turmas do TRT3 no que tange à relação de hierarquia. A Turmas entendem que se tiver coordenação e comunhão de interesses já estará configurado o grupo, sem necessidade de haver relação hierárquica.
No entanto, em que pese o entendimento do TST ser um pouco mais benéfico para as empresas, necessário se faz entender os requisitos legais para um determinado processo ser analisado por este tribunal superior.
- Pressupostos do Recurso de Revista para o TST e sua implicação nas demandas referentes a Grupo Econômico
Para que um recurso seja analisado pelo TST, ele deve cumprir alguns requisitos formais, nos termos do art. 896 da CLT.
Tais requisitos se referem à comprovação de divergência jurisprudencial, de contrariedade à súmula do TST ou súmula vinculante do STF, violação literal e direta à Constituição Federal ou à Lei Federal.
Ainda deve-se mencionar que para um recurso ser interposto no TST a empresa deve ter garantido o juízo na integralidade do valor da condenação, ou efetuado o pagamento de dois depósitos recursais, que atualmente estão no importe de R$30.177,45 (trinta mil, cento e setenta e sete reais e quarenta e cinco centavos).
Por fim, mais um entrave para a análise de um Recurso de Revista para o TST é a sua súmula 126: Incabível o recurso de revista ou de embargos (arts. 896 e 894, “b”, da CLT) para reexame de fatos e provas.
Resumindo, tem-se que para interpor um recurso no TST, e ter o mesmo analisado pelo tribunal, é necessário preencher os pressupostos formais de admissibilidade, garantir o juízo e, o ponto mais impeditivo no que se refere ao tema do grupo empresarial, não ser necessário o reexame de provas e fatos.
O que acontece na prática das demandas envolvendo grupo empresarial é que as decisões de 1ª e 2ª instância são integralmente baseadas em fatos e provas. Desta forma, quando a empresa consegue adentrar no TST, este não vai analisar o seu recurso se as decisões anteriores foram fundamentadas em provas do processo, o que ocorre na grande maioria dos casos.
Exemplificando, as decisões de 1º grau são baseadas em depoimento de testemunhas que conhecem de perto as empresas, os sócios das empresas, a família dos sócios, ou seja, toda a operação das empresas envolvidas, e vão em juízo contar o que sabem, o que servirá de fundamento da sentença.
Além do mais as empresas que não possuem coordenação entre si, ou não têm interesse conjunto, porém têm os mesmos sócios, ou os sócios são parentes ou amigos, acabam interferindo uma na outra, mesmo que de forma indireta, o que é detectado, por exemplo, pelas transações bancárias entre ambas ou entre seus sócios.
Sendo assim, são muitos os entraves para se chegar ao TST e ter uma reversão da decisão de considerou o grupo econômico, sendo o mais delicado deles a súmula 126 do TST, pois, se as decisões, principalmente dos tribunais, foram integralmente fundamentadas nas provas e fatos dos autos, o TST não vai reanalisar tais provas e, consequentemente, não apreciará o recurso.
Concluindo o presente artigo, verifica-se que o tema grupo econômico influência bastante as empresas, pois acarreta uma responsabilidade solidária de pagamento dos créditos trabalhistas. Mesmo com a reforma trabalhista, o princípio basilar do direito do trabalho, que é o princípio da proteção do trabalhador, impera no TRT3 de Minas Gerais. Em que pese o TST ter uma visão mais benéfica para as empresas, os entraves são significativos para que um recurso seja analisado por esta corte.
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